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quarta-feira, 15 de abril de 2015

Quilombo. O início da Independência

     Creio que é a primeira vez que se dá ênfase a essa comemoração. Já era tempo, porque que se fazia antigamente, aquela que ensinava na escolas, era deformação completa do que foram os quilombos - que eram apresentados como redutores de escravos fugitivos, malandros, criminosos, vivendo na maior promiscuidade.
     A perseguição aos escravos fugitivos era glorificada e a figura do capitão-do-mato, exaltada. As gravuras da época, naturalmente feitas segundo essa tradição, apresentavam o perseguidor magnificamente trajado, montado em fogoso corcel, arrastando os negros esquálidos, com o faciem pior que podiam arranjar. A destruição dos quilombos teriam sido uma obra redentora, uma limpeza do terreno, destinada a restaurar o princípio da propriedade, a ordem, a moralidade.
     Pesquisadores do porte de um Edson carneiro, sociólogos como Gilberto Freire, escritores como Edgar Rodrigues desmentiram essa infância histórica. Daí, o conhecimento melhor e competente desse episódio, cuja grandeza ainda desta vez não esta sendo totalmente revelada.
     Porque não será exagero apontar a epopéia dos quilombos como o inicio da Independência do Brasil. Pois foi com esses negros que nasceu a luta pela liberdade. Basta citar, cronologicamente, a data do Primeiro quilombo e a primeira expedição punitiva: 1602.
     Como colonização portuguesa, inicia-se a historia das lutas sociais no Brasil. A agricultura dominava a economia brasileira. Portugal, em consequência de um tratado com a Inglaterra, não grandes fazendeiros permitia a instalação nem de industria rudimentares. As primeiras tentativas de siderurgia foram assim proibidas no Brasil, como em outras colônias. Havia um artesanato sem expressão, formado por pequenas oficinas interligadas, produzindo para os senhores do engenho e para o governo. A agricultura vivia de mão de obra escrava, alimentada pelo trafego de negros da África chamada portuguesa. Esses escravos, depois de uma viagem em miseras condições, eram desembarcados e vendidos aos grandes fazendeiros que dominavam vastas arias de terra.
     A má alimentação, os espancamentos, o rigor do cativeiro, os castigos,tornavam mais odiosa a sujeição. As torturas são, hoje, peças de museu. Mas eram essas peças que mantinham a escravidão, submetendo homens arrancados de suas aldeias e transportados para outras terras, onde a condição humana lhes era negada.
     O que o admirável e deve ser exaltado é a capacidade de resistência moral desses escravos, que souberam reagir contra a desigualdade social, começando a escrever, a um só tempo, as reivindicações sociais e a independência contra o colonizador-opressor.
     Foram esses negros que não se abateram pela tortura; que preferiram a liberdade, arriscando a própria vida, que que fundaram as primeiras coletividades livres no país, os núcleos  iniciais da independência. A epopéia que começaram a escrever, com bravura, heroísmo e espirito de organização, foi seguida por outros brasileiros, brancos, pretos ou mestiços, nas diferentes tentativas pela independência em Pernambuco, na Baia, em Minas Gerais, no Rio Grande do Sul.
     Confinados nas senzalas e supliciados, os escravos organizavam-se em associações clandestinas, para conseguir dinheiro. A rudeza do trato e as condições de um sistema imposto pelo colonizador obrigaram o trabalhador rural a declarar guerra a esse tipo de propriedade privada, às autoridades que prestigiavam o sistema e ao latifúndio que o obrigava.
     Essa é a origem dos quilombos. Não era possível a reivindicação dentro de um sistema que não comportava reivindicações. Daí, a fuga. E como a perseguição se fazia cruel, os fugitivos se agrupavam, estabelecendo a resistência.
     Formam-se os quilombos. As fuga do trabalhador rural passou a obedecer a um planejamento que se aperfeiçoou, pondo em xeque a economia feudal e desafiando os exércitos da monarquia portuguesa. Nada do banditismo do cangaceirismo dos negros, da heroicidade só reconhecida nos aguerridos exércitos que derrotaram e destruíram as rebeliões campesinas e as comunidades perfeitamente organizadas. Porque os quilombos foram mais do que simples agrupamentos de fugitivos, porque organizavam povoados, fizeram plantações, criaram comunidades, resistiram anos e anos a repetidas expedições punitivas. A relação dos quilombos, a descrição dos mais importantes como Rio Vermelho (1632); Itapicuru (1636); na Baia; Riu das Mortes (1751), em Minas Gerais; Malonguinho (1836) nas vizinhanças do recife; de Manuel Congo, em Pati do Alferes, Estado do Rio, revelaram um estilo de vida e uma sociedade que pôde servir de modelo.
     O Quilombo dos Palmares teve uma organização social digna de estudos. Era um regime comunitário, onde não circulava dinheiro. Mas foram necessários 18 expedições, comandadas por capitães-mor, por altas patentes militares e milhões de soldados, durante 92 anos, tomaram as terras, destruíram as plantações, mataram e venderam os negros que conseguiram aprisionar. A figura de Zumbi, assinalada como herói do quilombo, deve ser reverenciada como primeiro homem que lutou pela liberdade e pela independência do Brasil¹

¹ Diário de Noticiais, Rio de Janeiro, 20 de novembro de 1973. Depoimento do historiador Hélio Silva, embasado em nosso livro Socialismo e Sindicalismo no Brasil - 1675 -1913.
Extraido:

Livro: A NOVA AURORA LIBERTARIA (1945 -1940)Autor: Edgar Rodrigues
Paginas:226 Á 227
Ano:1992

Editora: Achiámé

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