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quinta-feira, 11 de julho de 2013

Bakunin foi para o céu!

Miguel Bakunin, o velho revolucionário russo, enfim morreu, para a tranquilidade dos reis, presidentes, burgueses e marxistas. Morreu e, com seu extenso curriculum debaixo do braço, foi direto para o Inferno. Lá chegando, foi recebido na portaria pelo próprio Belzebu que, passando os olhos no espesso calhamaço, disse entusiasmado:
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- Belo curriculum hein Sr. Bakunin! Décadas de luta contra a Igreja, participação em inúmeras insurreições, expulso de vários países, prisões, porres homéricos...Com tudo isso, vou lhe enviar para o Setor 1 aqui do Inferno, que é mais tranquilo, as penas são moleza, uma deferência para uma celebridade como o senhor.
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Dito e feito, lá se foi Bakunin para o Setor 1.
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Três dias depois, estava lá Belzebu distraidamente mexendo seu caldeirão cheio de almas, quando é repentinamente interrompido por um esbaforido diabo-auxiliar, que dá seu relatório urgente:
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- Mestre, está uma zona lá no Setor 1! O Bakunin organizou as almas em um sindicato e foi decretada uma paralisação geral pela diminuição da jornada de penitências, temperatura mais amena e um monte de outras coisas.
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Belzebu ficou puto nas calças e decretou:
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- Porra, esse cara é um mal agradecido! Se ele pensa que vai zonear os meus domínios como fez lá na Terra, está muito enganado. Pega ele e manda para o Setor 2 que ele vai ver o que é bom pra tosse!
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E lá se foi o velho Miguel para o temido Setor 2.
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Três dias depois, lá estava Belzebu torturando uma almas recém-chegadas, quando novamente é interrompido pelo diabo-auxiliar que, com os nervos a flor da pele, deu seu novo relatório:
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- Chefe, o Setor 2 está em greve de ocupação! Bakunin e mais uma comissão de almas exigem audiência com o senhor para a apresentação de uma pauta de reivindicações quilométrica. Eles querem penas mais suaves, equiparação com o pessoal do Setor 1, adicional de insalubridade, lazer nas horas vagas.
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- Chega!!! - interrompe o diabo-superior - Esse barbudo está querendo anarquizar com o meu Inferno. Vou acabar já já com essa insubordinação, tá pensando o que! Pega esse anarquista e manda ele para a solitária, que eu quero ver ele organizar alguma coisa.
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Bakunin só foi retirado a muito custo do Setor 2 com intervenção da Tropa de Choque, pois as almas tentaram impedir a sua saída com barricadas, pedradas e muita porrada.
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No dia seguinte, quando Belzebu ainda nem tinha se refeito dos contratempos da véspera, chega o diabo-auxiliar mais nervoso ainda e solta o último relatório:
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- Mestre, o Inferno inteiro está em greve geral de solidariedade ao Bakunin. Todos exigem sua imediata libertação.
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- Basta! - urrou belzebu - Vou mandar esse cara imediatamente para o Céu, coisa que já devia ter feito a muito tempo. Imagina só a balbúrdia que ele vai aprontar por lá; ele em uma semana vai conseguir esculhambar aquilo tudo. Como eu não pensei nisso antes!
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E lá se foi Bakunin - quem diria! - para o Céu, onde foi recebido por São Pedro. Folheando seu curriculum, ele disse:
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- Sr. Bakunin, que coisa feia! Anticlericalismo, revoluções, prisões, bebedeiras...Bom, mas como a piedade de Deus é infinita e como o senhor veio deportado do Inferno, pode entrar na casa do Senhor.
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E assim, Miguel Bakunin entrou no Céu.
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Lá embaixo, Belzebu estava na maior expectativa com as notícias do Céu. Cara colada na home-page celestial (afinal, ele era um capeta atualizado), esperando notícias de uma sublevação geral no Reino do Senhor. Passa um dia, dois dias, três, quatro, e nada, nenhuma notícia de anormalidade lá em cima. Quando deu uma semana, Belzebu não suportou, pegou o elevador e foi lá conferir pessoalmente. Discretamente, assobiando e com as mãos para trás, ele foi se aproximando da portaria do Céu, onde estava São Pedro trabalhando normalmente. Encostou no guichê, olhou distraidamente para as unhas, e puxou papo com São Pedro:
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- E aí Pedro, tudo bem por aí?
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- Tudo tranquilo como sempre. - respodeu o santo.
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- Vem cá, e um cara que eu mandei praí, um tal de Miguel...
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- Bakunin - completou São Pedro. - Ele está bem, por quê?
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- Nada em especial, mas... ele não tem feito nenhuma agitação por aí?
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- Não que eu saiba - respondeu Pedro.
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- E Deus, não comentou nada sobre esse tal Bakunin? - perguntou o diabo.
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Nesse momento, São Pedro se levantou, colocou as duas mãos nos ombros de Belzebu e, olhando nos seus olhos, falou decidido:
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- Companheiro Belzebu, Deus não existe!
.(Texto escrito pelo Círculo de Estudos Libertários Ideal Peres - CELIP - e publicado no informativo Libera nº 89, outubro de 1998, caixa postal 14576, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, CEP 22410-971, farj@riseup.nethttp://www.farj.org/
Extraído de:

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